Conto por Adriano Amaral
Era uma quinta qualquer, dessas que não se tem muita expectativa. A falta de expectativa é tanta que as pessoas criaram uma marca para a porra da quinta de merda “TBT”. Do ingles, “Throw Back Thursday”, retorno a uma boa quinta do passado. Todo mundo usa essa merda, santa falta de qualquer substancia. Isso vale pra mim também. Não me canso de voltar as minhas quintas passadas, e não só as quintas. O passado sempre se mostra uma dama a ser cortejada. Já o futuro uma megera inconstante.
Pois bem, acordei com um generoso sonho do inconsciente. Ele sempre é generoso quando pedimos algo. Eu pedia a ele, que me fizesse um carinho, diante de uma notícia avassaladora que tinha recebido na terça. Embora tivesse sido eficaz, ainda acordava delirando com um passado que poderia muito bem voltar a existir. Enfim, sonhos e devaneios. Decidi logo cedo que iria encher a cara. Isso, esse era um remédio excelente para péssimas noticias. Sempre mulheres, elas são as grandes governantes desse mundo que os machos insistem em dizer que lhes pertence. Elas sempre estão ali, escondidas aos olhos desavisados, mas por trás de toda e qualquer decisão tomada no mundo físico. Teoria “bucêntrica”, onde tudo gira entorno dela: A buceta, sua tirana!
Estava contando os minutos pra encher a cara e me abrir para o incerto. Essa é uma das magias que poucas pessoas tem a coragem de afirmar. As incertezas e surpresas que as noites bêbadas carregam. Havia combinado com os “pals” que velejam comigo aos sábados. Minha única opção nessa terra distante e que não era a minha. Sentia muita falta das noites Pinellianas. Para quem não conhece, o Pinella era uma espécie de portal dimensional, que se abria de vez enquanto entre uma taça e outra. Que bar, que noites…Sobrava a idéia Irlandesa de curtição. Resolvi que não iria de carro. Não era aconselhável ser preso numa blitz qualquer. A solidão era desejada, e adoro a mim mesmo com uma taça na mão e a maquina de escrever na minha frente. Entretanto desde que havia me mudado sozinho para essa terra mística e estranha, queria um pouco de contato e boas risadas. Risadas são um instrumento muito eficaz contra a depressão. Adorava ver as pessoas sorrindo, e me especializei em tentar fazer elas sorrirem. Gostava dessa suposta habilidade. Uma das poucas que sabia fazer bem. Na terça, havia descoberto que não tinha plantado sorrisos, mas tempestades. Fazer o que? Somos vítimas do que achamos que somos. Prisioneiros das imagens que criamos sobre nós. Eu era mais uma vitima.
Peguei o ônibus, caminhei até a marina. Lugar que havíamos imaginado para essa noite insólita. Ciaran estava me ligando.
– Cade voce?
– Te vendo aqui…
Acenei para ele. Ciaran era um tipo diferente. Um dos poucos irlandeses que ficavam intrigados com nossa latinidade. Por latinidade, entenda eu e Mario, um peruano que também estava perdido por aqui. Talvez em algum momento eu conte a história fantasiosa de Mario, achava ela um pouco exagerada, mas ainda sim era uma boa história. Ciaran era um tipo roqueiro, cabelo cumprido e trançado. Dava boa risadas das nossas estórias. Mas nunca contava uma engraçada. Ainda assim era um bom parceiro. Ele que havia nos convidado para tomar uma.
Aqui começam como todas essas noites começam. Achávamos que iriamos beber no já tradicional, “Wine House”, um pub que ficava bem em frente a Marina. Estava cheio, e a parte do “yard” não estava aberta. Pós pandemia, vários pubs e restaurantes estavam com problemas para contratar garçons. Isso merece um capitulo a parte. As lindas garçonetes do Wine House. Sempre elas, as mulheres. Ciaran sugeriu que fossemos a outro lugar. Greystones não era uma área para beber todas. Ainda assim era o que tínhamos para hoje. Não importa, bebia para esquecer, e para que nos deparássemos com o incerto. Tinha essa fé. Mal sabia o que me aguardava. Chegamos ao Burnaby, embora a baladinha fosse no Mrs. Robinson. Decidimos Burnaby, porque havia comida. Habito irlandês que era difícil de minha latinidade compreender: um bar sem petisco, só para encher a cara. Chegamos ao Burnaby, vazio, ambiente familiar. Pensei – “Que lama, vai ser uma simples cachaçada, vômitos, dores de cabeça e esquecimento da ultima terça”. Sempre tinha a expectativa de algo mais sabe? Um bom papo, uma companhia inesperada, uma música que me transportasse para alguma boa lembrança, ou me remetesse a algo que ainda iria ou gostaria de viver. Seria difícil algo assim essa noite.
Primeira vez que entrava no Burnaby. Tinha uma cara desses restaurantes americanos. O balcão do bar ficava no centro, nele se via várias xícaras de cappuccino todas aguardando para serem servidas. Eram muitas, chamei a atenção de Ciaran e Mario.
– Olha lá, parece que haverá uma noite selvagem aqui hoje – ironizei
Tava fudido. Aguardamos um bocado para nos oferecerem uma mesa. Pedimos lá no fundo, no quintal. Ali parecia um pouco mais promissor. Tinha alguns sujeitos, todos debaixo o toldo e com aquecedor ligado. Era Brasileiro, iria adorar um calorzinho daqueles. Não havia mesa. Fomos para a friagem. “Ainda bem que tinha vindo agasalhado” pensei. Pior coisa tentar relaxar e ficar passando frio.
Sentamos lá fora, nenhuma mesa ocupada alem da nossa. Como é difícil achar espaços para umas trocas filosóficas não é mesmo? Mario era um desses caras de 35 anos que achava que ainda tinha 15 anos. Sempre inventando estórias e fazendo as parecer mais interessante do que realmente eram. Ele havia começado
– Não sabem da maior… disse ele
– O que? – interroguei
– Comprei um barco!
Ficamos todos felizes por ele. Passou um bom tempo da noite contando a saga para comprar o barco. Nada mal pensei, com uma ponta de inveja. Por outro, imaginava o que fazer com um barco já que havia terminado a temporada e provavelmente sair com ele no inverno seria um pé no saco. Queria pedir algo para beber, urgentemente. Faltam garçons, portanto, uma vida para pedir algo. Acelerei e sugeri que bebêssemos vinho, qualquer néctar para me tirar daquele tédio. Sentia falta de algumas companhias. Aquelas que sabiam os caminhos misteriosos para adentrar em Nárnia. Nárnia era como eu, Vitor e Mariah chamávamos nossas aventuras psicodélicas aos redutos da mente. Filosofar da um barato total. Tem que apenas saber a medida de ficar chato, ou ficar falando sobre suas opiniões por tempo demais. Era preciso saber balancear a compor um mosaico com todas as idéias que iam surgindo numa mesa de bar como aquela.
Mario ainda continuava a falar da porra do barco. Socialmente você tinha que sorrir, elogiar e dizer como aquilo era majestoso. Era isso o que uma pessoa esperava ouvir quando insistia tanto numa estória. Perspicácias sociais, para arranjar companhias, mesmo que não muito agradáveis. Em episódios soltos daquela narrativa, ele comentou que uma coroa do clube de vela havia se oferecido para ajudar. Ciaran riu alto e comentou:
– Ela é um saco, sempre solícita para ajudar. Mas todos a acham uma chata de marca maior. O pior, parecia ser uma dessas coroas carentes que sempre tinha uma malícia por trás.
Mario tava arranjado, iria ganhar uma carona para o barco, mas teria que pagar deixando ela mamá-lo. Riamos alto.
Pedi algo para comer, tinha medo de ficar completamente bêbado, rápido, com a barriga vazia. Impressionante a criatividade irlandesa: wings, burguer, brownie. Wings then!
Surpreendentemente 4 mesas foram ocupadas, todos com mulheres. Afinal a sorte resolveu sorrir novamente, pensei. Elas deixam o ar sempre mais leve, e tudo que parecia confuso se clareia um pouco mais. Particularmente, uma delas veio nos perguntar se tínhamos isqueiro. Sempre tinha um na bolsa, junto com minhas tralhas de cachimbo. Ela se aproximou. Era uma morena com olhos verdes, boca carnuda, e cabelo preto rebelde e longo. Usava roupas leves, meio “riponga”, meio despretensiosa. Se aproximou com um cigarrinho enrolado a mão. Boca com um batom vermelho. Abriu um sorrisinho maroto, dessas mulheres maliciosas que sabem seduzir. Se aproximou da minha cadeira, abaixou e pude ver um pouquinho do seu decote, nada mal, um sutiã de rendinha rosa também, saltou aos olhos. Sorriu, aparei o vento com a mão, acendi o cigarro para ela. Estava cheirosa. Adoro mulheres cheirosas. Disse-lhe que tinha uma proposta a lhe fazer:
– Se você me der um cigarro também, não precisa me pagar pelo fogo.
– E se eu quiser ficar te devendo, fogo? – aquilo me deixou completamente excitado.
– Ai teremos um problema, pois meus juros são altos…
Ela sorriu, se afastou, através da saia largada pude ver os seus contornos. Nada mal, eram voluptuosas suas curvas, sua bunda. Que delicia, pensei. Ela olhou para trás, via que tinha meus olhos naquela bunda linda. Sorriu! Sorri de volta, e os olhos dela me penetraram. Como amava os olhares. Eles sempre tinham tanto a dizer, no silencio entre duas frases. Amava o silencio do olhar e do sorriso. Deveriam se construir monumentos a essas duas coisas: o olhar, verdes como o mar da Bahia, e o sorriso maroto, espreitado, de quem muito sabe e nada diz.
Ciaran sinalizou que estava dando seu horário, já que tinha esposa e filho pequeno em casa. Sinalizou para a conta. Olhei para a riponga com olhar Itaparicano, ela parecia assustada que iriamos embora. Olhei para ela, e fiquei feliz em vê-la nos fitando, me fitando. Sorri, suspendi os ombros meio que dizendo que não sabia o que estava acontecendo. Ciaran se levantou, deixou um abraço, se despediu e se foi. Éramos eu e o mentiroso do Mário. Sei que quem conta um conto, aumenta um ponto. Mario era daqueles caras que sempre faziam muito sucesso entre os incautos. Tinha histórias para tudo, e sempre parecia mais interessante do que era de fato. Fazia caras, e bocas, cenas, como quem se diz interessante. Era novo, talvez em algum momento cairia a ficha, de que a vida é mais interessante quando não há a ficção. A Vida é Bela, já dizia Begnini. Embora gostasse mais da Beleza Oculta dos silêncios, cheio de infinitas possibilidades. Havia lido isso uma vez e tinha me marcado muito. Como o silencio, uma tela em branco, traz consigo infinitas possibilidades. Uma potestade em essência. Pode ser tudo o que quiser. Até que o silencio se rompe, ou a tela receba a primeira pincelada. A partir dai, um sacrifício aos antigos Deuses era realizado. As infinitas possibilidades se transformam em uma, amorfa. Como isso era incrível. Do universo mágico e infinito do mundo ideal que habita nossa mente, sacrificávamos as possibilidades, para que houvesse a existência. Existencia débil, feia, confusa, mas existência. O existir é um sacrifício em si. Precisava mijar.
Já estávamos na 4a garrafa. Pensei: “Já devo ser um bêbado profissional, pois não estou sentindo nada”. Abri um sorriso, daqueles que só o clarividência pode entender. Mario continuava falando. Não sabia aproveitar o silêncio. Ninguém sabe. Por isso invejava Mario. Ele era muito mais interessante do que eu jamais seria. Mesmo que isso fosse superficial, a porra do mundo era superficial. Mario, logo, lograria muito mais sucesso. Bem feito trouxa, que se acha interessante por ter conteúdo. Foda-se o conteúdo, no mundo das frivolidades superficiais.
Levantei, e tudo começou a rodar. Ria alto agora. Onde tinha ido parar o profissionalismo etílico? Cambaleie até o banheiro. Difícil mirar, tudo girava. Porra de “Chicken Wings”, sabia que esse troço não era para botecos, mas sim para PUBs. Lavei bem as mãos, afinal, bons hábitos que a pandemia trouxe. Sequei parcialmente as mãos no rosto, e depois no secador a vento. Vale um capitulo a parte só para amaldiçoar o inventor desses secadores de mãos a vento. Abri a porta. A sorte realmente estava ao meu lado. A riponga saia do banheiro também, ajeitava a saia. Que bunda. Fiquei hipnotizado. Ela virou, viu que meus olhos bêbados estavam voltados para suas ancas. Levantei a cabeça e ela sorria, como me repreendendo por olhar para suas partes baixas. Fascinante como o pudor e a putaria se entrelaçam. Pares que se atraem, e quando você acha que mais pudor existe, mais putaria se apresenta. Ah o sexo, seu eterno misterioso, o mistério do sexo.
– Voce estava olhando para minha bunda, não estava? – Ela me perguntou. Pensei antes de responder essa pergunta. Já havia errado em várias ocasiões, essa resposta.
– Inevitável! Impossível não olhar para sua bunda, já que ela é tão linda…
Não fazia idéia se essa era a resposta certa. Saiu desse jeito, débil e bêbada a resposta. Descobriria em breve que era. Adorava o jeito direto das européias. Como que te desafiando. Havia observado uma linda mulher em Paris uma vez. Ela me olhou, e estendeu um grande dedo. Foda-se, dizia aquele grande dedo. Havia ficado apaixonado diante daquele desaforo. Primeiro pela liberdade de poder dar um grandíssimo “foda-se”, segundo pela auto-confiança feminina. Isso era um verdadeiro afrodisíaco. Desaforos o são. Minha reflexão havia sido interrompida por outra questão.
– Quer dizer que você gostou da minha bunda? – Ela perguntava novamente.
– Sim, doido de quem não gostar – Ela sorriu. Nos entre-olhávamos, silêncio, e o sorriso. Te adoro silêncio, hiato entre frases e atos.
Estiquei minha mão em direção ao seu pescoço. Ela não reagiu. Havia passado no teste. Afastei vagarosamente o cabelo comprido, acessando sua nuca. Meu corpo já estava próximo ao dela, principalmente após o sinal verde que ela havia me dado. Puxei a nuca dela delicadamente. Ela ja estava fechando vagarosamente os olhos. Estava entregue. Puta que o pariu. Como esse momento é magico. Quando entregamos ao outro, ao beijo, a carícia. Poucas coisas se sobrepõem a esses poucos segundos. Tudo que disse a pouco se mistura. As infinitas possibilidades, as expectativas, o sacrifico, o olhar, o silêncio, a entrega enfim o prazer. O beijo era a obra, saberíamos se era prima ou não em breve. O beijo bêbado. O beijo é ótimo. Mas o bêbado tem um “que” especial. Pois não há queixa, não há julgamento, simples e direto, como deveria ser.
Um beijo longo, ela beijava bem. Eu nunca soube a resposta para essa pergunta. Meu pau já estava nas alturas, mesmo naquele frio irlandês. Puxei o corpo dela contra o meu, esfregando nela, toda a minha ereção. Queria que ela visse o tanto que a desejava. Dei uma olhada por cima do seu pescoço, se havia alguém observando. Uma mão, na sua nuca, acariciando os seus longos cabelos, a outra…ah a outra, tinha que apertar aquela bunda maravilhosa. Enchi minha mão com aquela bunda perfeita. Nem mole demais, nem escassa demais. Ela suspirou. Havia gostado, se surpreendeu, mas gostou. Joguei o corpo dela contra a porta do banheiro. Não fazia idéia se era o feminino ou masculino. Muitas variáveis para um bêbado como eu. Entrei, fechei a porta. Abri minha calça. Hora da verdade. Ela sabia exatamente o que fazer. Se ajoelhou e colocou na boca com maestria. Um bom boquete é sempre memorável. Esse era um sem dúvida. Infelizmente sou um chupador inveterado. Amo o cheiro, o sabor, a textura. Puxei-a pelos cabelos, delicadamente. Dei-lhe um beijo agradecendo aquele boquete automático, adorava quando eram automáticos. Joguei-a contra o espelho e a pia do banheiro. Perfeito, a pia com seu volume, contra o corpo dela, criava a distancia perfeita para empiná-la. Agachei ate embaixo para alcançar o inicio da saia longa. Inicio ou final? Nunca soube. Referências perdidas de um sexo arbitrário. Passei minhas mãos pelas suas coxas geladas. Impossível não ficar com frio nas pernas naquele sereno, e com uma saia tão fina. Chegava a calcinha e aquela bunda. Tarado em calcinhas, mas já não importava muito naquele momento. Puxei rápido e delicadamente. Pensava comigo mesmo, como era bom naquilo. Esse é um daqueles troféus singelos de um homem de meia idade. Puxar uma calcinha, rápida e assertivamente. Tinha dado sorte, não era tão bom assim. Lambuzei-me. Perco a compostura, se é que tenho alguma. Com a cara enfiada no meio daquelas nádegas, sugando, lambendo, saboreando cada pedacinho daquela riponga. Ela tremia, ficava nas pontas dos pés. Delicia. Não sei quanto tempo fiquei ali. Adorava os sons que ela fazia. Adorava aquilo. Bateram na porta.
– Fiona, está ai?
Findando um gemido respondeu:
– Sim, tô saindo.
– Porque está demorando tanto?
– Nada, te conto depois…
– Ok, já pagamos. Estamos te esperando lá fora.
Fiona era o nome daquela suculência toda. Nos despedimos com um beijo longo. Aquele cheiro todo, que tanto me encantava, estava ainda ali, na minha barba e bigode. Freud tinha razão, os pêlos do bigode tem uma relação direta com os pêlos pubianos.
– Adorei – disse para Fiona
– Eu também.
– Adeus.
– Até
Não me lembrava que estava bêbado. Não estava mais girando, embora ainda estivesse inebriado. Como era bom estar inebriado.